quinta-feira, setembro 06, 2007

A VACA NA QUINTA


O agricultor Quintas está preocupado com a sua vaca Cornélia, uma vaca premiada. De facto, está tão preocupado, que quando o homem que trata das suas vacas leiteiras lhe diz que a Cornélia está a pastar feliz e contente na quinta, ele sente a necessidade de o saber ao certo. Não quer apenas assegurar-se a noventa e nove por cento de que Cornélia está em segurança. Quer estar em condições de poder dizer que sabe que Cornélia está bem.
O agricultor Quintas vai à quinta e, colocando-se junto do portão, vê à distância, por detrás de algumas árvores, uma forma branca e preta que reconhece como a sua vaca preferida. Volta para junto do homem que trata das vacas leiteiras e diz ao seu amigo que sabe que a Cornélia está na quinta.
Será que nesta fase o agricultor Quintas o sabe realmente?
O homem que trata das vacas leiteiras diz-lhe que irá também controlar, indo à quinta. Aí encontra Cornélia, a dormir uma sesta numa cova, por detrás de um arbusto, invísivel do portão. Repara também num grande pedaço de papel preto e branco que ficou preso a uma árvore.


Cornélia está no campo, como pensava o agricultor Quintas. Mas tinha ele razão ao dizer que sabia que que era ali que ela estava?



Discussão
Muitas pessoas diriam que, dada a fragilidade humana, é suficiente dizer que sabemos algo se:

. cremos que é o caso;
. temos boa e relevante razão para a nossa crença;
. é de facto o caso.

Isto é o conhecimento como ‘crença verdadeira justificada’.

No entanto, no caso do agricultor Quintas todas estas condições são satisfeitas e, no entanto, podemos ainda sentir que ele não sabe realmente que a Cornélia está na quinta.
Este problema é já referido no Teeteto de Platão (201 c – 210d) e tem causado perplexidades em muitos filósofos desde então expostas numa linguagem um pouco mais formal (…). Neste exemplo, o agricultor Quintas:

. acreditava que a vaca estava em segurança;
. dispunha de evidência de que assim era (a sua crença era justificada);
. e era verdade que a vaca estava em segurança.

Contudo, podemos ter a impressão de que ele não o ‘sabia’ realmente. O que tudo isto sugere é que precisamos de uma definição diferente de ‘conhecimento’. Embora todo o conhecimento tenha de incluir ‘crenças justificadas e verdadeiras’, nem todas as crenças justificadas e verdadeiras parecem ser conhecimento. Muitos filósofos diriam que o que é necessário é uma avaliação mais complicada (!) para contornar este contra-exemplo."

Martin Cohen, 101 Philosophy Problems (3ª ed 2007). Tradução Carlos Marques.

Sem comentários: