quarta-feira, outubro 24, 2007

Da lentidão filosófica

Sandro Botticelli, Jovem apresentado por Vénus, Florença, 1510

A tão desprezada massa sabe muito bem o que é um filósofo. Na democracia da fala, encarar as coisas com filosofia passa a ser uma expressão de tranquilidade, um gasto generoso de tempo, o luxo de adiar a decisão que a outros urge. Embora ocasionalmente se disfarçe de executivo, o filósofo não engana ninguém com a sua inconfundível lentidão. Alguma coisa terão visto as pessoas nestes últimos dois mil e quinhentos anos para lhe atribuírem esta peculiar habilidade em que consiste a sua falta de habilidade.Penso que, pelo menos nisto, o povo não se engana. Mas seria melhor que se entendesse a demora como uma propriedade geral da condição humana, que os filósofos desenvolvem de um modo especial(...)
Em todo o ser vivo há como que uma tendência a responder sem hesitação às perguntas que se lhe colocam. O esquema estímulo-resposta não é um campo de reflexão mas - provavelmente por isso -uma condição para a sobrevivência. Grande parte do comportamento humano corresponde a esta imediaticidade.Mas há qualquer coisa que se furta aos imperativos da instantaneidade. O homem é o ser que vacila(...) o homem é o ser que se entretém e entretém, que cavila. É uma característica especificamente humana aquilo a que poderíamos chamar -embora na nossa língua,actualmente, não devamos -pensatividade(...)

Daniel Innerarity, A Filosofia como uma das Belas Artes, teorema, 1995, Lisboa

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