domingo, junho 27, 2010

sugestões para a educação dos jovens.


O Absinto, 1876, Paris, Edgar Degas

"...ligamo-nos aos nossos semelhantes menos pelo reconhecimento dos seus prazeres que pelo reconhecimento das suas penas; pois vemos melhor, por aí, a identidade da nossa natureza e a garantia da sua ligação connosco. Se as nossas comuns necessidades nos unem pelo interesse, as nossas misérias comuns unem-nos pela afeição.O aspecto de um homem feliz inspira aos outros menos amor que inveja; acusá-lo-emos de usurpar um dreito que não tem ao tomar para si a exclusividade da felicidade; e o amor-próprio sofre ainda porque nos faz sentir que não precisa de nós para nada. Mas quem é que não se compadece do infeliz que vê sofrer? Quem não desejaria libertá-lo dos seus males se o custo não fosse demasiado alto? A imaginação coloca-nos melhor no lugar do miserável do que no do homem feliz. A piedade é doce, porque ao colocarmo-nos no lugar daquele que sofre experimentamos o prazer de não sentir como ele. A Inveja,é amarga na medida em que o aspecto do homem feliz, longe de suscitar ao invejoso colocar-se no seu lugar, dá-lhe, pelo contrário,o remorso de não o poder fazer.Parece que um nos isenta dos males que sofre e o outro nos afasta dos bens que usufrui.
Se quereis excitar e alimentar no coração de um homem jovem os primeiros movimentos da sensibilidade , e formar o seu carácter para o bem agir e a bondade; não tenteis fazer germinar nele o orgulho, a vaidade, a inveja, através da imagem enganadora da felicidade dos homens; não exponhais logo aos seus olhos a pompa da corte, o fausto dos palácios, a atracção dos espectáculos; não o passeies pelos circuitos, nas brilhantes asembleias, não lhe mostreis o exterior da grande sociedade que depois poderá vir a  apreciar em si mesma. Mostrar-lhe o mundo antes que conheça os homens, não é formá-lo, é corrompê-lo; não é instruí-lo, é enganá-lo.
Os homens não são naturalmente nem reis, nem grandes, nem cortesãos, nem ricos; todos nascem nus e pobres, todos sujeitos às misérias da vida, aos desgostos, aos males, às necessidades, às dores de toda a espécie; enfim, todos estão condenados à morte. Aqui está o que é verdadeiramente o homem; aqui está aquilo a que nenhum mortal pode escapar. Comecem então por estudar a natureza humana, no que lhe é inseparável, no que constitui o melhor da humanidade."

Jean Jacqes Rousseau, L' Émile, Flammarion,1966, Paris, p. 287
Tradução de Helena Serrão

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