Caravaggio, Narciso, 1598/99, Roma
Tradução de Aires de Almeida
O método afectivo de avaliação crítica consiste em avaliar a obra pelos seus efeitos psicológicos, ou pelos efeitos psicológicos prováveis, sobre o próprio crítico ou os outros. Como mais adiante se tornará patente, não considero irrelevantes as razões as razões afectivas para a avaliação dos objectos estéticos (...)Neste momento, apenas defenderei que as razões afectivas, só por si, são inadequadas, porque não são informativas em dois aspectos importantes.
Primeiro, se alguém afirma que ouviu o anadamento lento do Quarteto de Cordas em Mi Bemol Maior (Op.127), de Beethoven, e que lhe deu prazer, ou nos adverte que nos daria prazer, penso que deveríamos considerar esta advertência uma resposta fraca a esta grande música. E, contudo, num sentido muito amplo e vago é verdade que nos dá prazer, tal como os amendoins salgados ou um mergulho em água fresca. Somos, assim, a perguntar que tipo de prazer nos dá e como difere esse prazer de outros, se é que assim pode ser chamado, e como obtém a sua qualidade única precisamente a partir dessas diferenças. E esta linha de investigação levar-nos-ia ao segundo aspecto. Pois uma afirmação afectiva informa-nos sobre o efeito da obra, mas não identifica as características da obra que causam esse efeito. Poderíamos ainda perguntar, por outras palavras, o que há de prazenteiro nesta música que está ausente noutra música. Esta linha de investigação seria paralela à primeira, uma vez que nos conduziria a discriminar este tipo de prazer de outros que têm diferentes causas e objectos.
As mesmas duas questões poderiam ser levantadas acerca da noção geral que parece estar implícita nas outras razões afectivas: a obra é boa se conduz a uma forte reacção emocional de um certo tipo. mas de que modo difere a reacção emocional das fortes reacções emocionais geradas por telegramas anunciando mortes, por sustos de morte em carros descontrolados, pela doença grave de um filho, ou por um pedido de casamento? Há certamente uma diferença importante que a explicação da reacção emocional tem de ter em conta para ser completa. O que há no objecto estético que causa reacção emocional? Talvez seja alguma qualidade específica intensa, na qual a nossa atenção está centrada quando estamos perante a obra. De facto, alguns termos afectivos são muitas vezes enganadores, pois são realmente sinónimos de termos discritivos: querem dizer que o objecto tem certas qualidades específicas num grau de intensidade apreciável. E nesse caso, é claro que a razão já não é afectiva, mas objectiva. (...)
Penso que ao inspeccionarmos bem as razões presentes nos juízos críticos, podemos inseri-las, sem grande dificuldade, em três grupos principais. Em primeiro lugar, há razões que parecem ser suportadas pelo grau de unidade da obra:
... é bem organizada (ou desorganizada).
... é formalmente perfeita (ou imperfeita).
... tem uma estrutura e um estilo internamente coerentes (ou incoerentes).
Em segundo lugar, há razões que parecem apoiar-se no grau de complexidade ou simplicidade da obra:
... é desenvolvida em larga escala.
... é rica em contrastes (ou falta-lhe diversidade e é repititiva).
... é subtil e imaginativa (ou grosseira).
Em terceiro lugar, há razões que parecem apoiar-se na intensidade ou falta de intensidade das qualidades humanas específicas presentes na obra:
... é cheia de vitalidade (ou apagada).
... é poderosa e vivida (ou fraca e deslavada).
... é terna, irónica, trágica, graciosa,delicada, profundamente cómica.
Monroe Beardsley, Estética, 1958
Tradução de Aires de Almeida
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