Aquele que fabrica arte, aquele que escreve, não devia nunca esquecer que reforça a colectividade. A sua individualidade não é senão uma forma de colectivo. É preciso que saiba que a sua expressão, como a da linguagem, é sempre, faça o que fizer, uma tentativa com vista à aprovação e não à revolta. E tudo aquilo que ele pensa e diz envolve totalmente a comunidade, a sua comunidade. (…)
O artista engana-se ao querer estar só; são perigosos e ilusórios os prazeres retirados do hermetismo. Podem conduzir à inexpressão, quer dizer à morte. O artista não é um semi-deus nem um profeta. Não é mesmo forçosamente um homem inteligente. É um emotivo, só isso. Não inventa nada; não cria nada. Não tem génio. Sabe apenas fazer sínteses. É um bom organizador. Hoje não exigimos mais ao artista que seja artesão. As especializações vêm-nos do tempo em que os dons da expressão nos indivíduos eram desiguais; havia o hábil de mãos, o que falava bem, aquele que tinha boa voz para cantar, ou boas pernas para dançar. Mas a sociedade actual não sente mais a necessidade de perfeição expressiva; está aberta a todas as formas. Cada um tem verdadeiramente uma alma, cada um tem qualquer coisa a dizer. A noção de estilo existe ainda por hábito, mas a verdade da arte, hoje, está na sensibilidade, já não está na técnica. A arte não é possível de outro modo senão pela emoção. O que procuramos, é menos um cálculo exacto do mundo do que uma evocação afectiva que o permite entender num plano exterior à realidade.
É isto, um erro? Terá sido este deslizamento do domínio do real para o domínio do emotivo que desviou a arte do seu percurso na direcção da consciência? Ou é o começo de um novo caminho na direcção de uma consciência verdadeiramente humana, por assim dizer presa na sua própria aventura falível e sem verdade intemporal?
Talvez o movimento na direcção da beleza não seja mais que uma espécie de tentativa para alcançar a revelação. Beleza dos objectos que é preciso aprender a ver como são, desprovidos dos seus mistérios e dos seus rituais, reino de tudo o que é igual, não igualmente indiferente, mas igualmente poderoso, igualmente atroz, igualmente sumptuoso, reino de tudo o que acontece.
O artista engana-se ao querer estar só; são perigosos e ilusórios os prazeres retirados do hermetismo. Podem conduzir à inexpressão, quer dizer à morte. O artista não é um semi-deus nem um profeta. Não é mesmo forçosamente um homem inteligente. É um emotivo, só isso. Não inventa nada; não cria nada. Não tem génio. Sabe apenas fazer sínteses. É um bom organizador. Hoje não exigimos mais ao artista que seja artesão. As especializações vêm-nos do tempo em que os dons da expressão nos indivíduos eram desiguais; havia o hábil de mãos, o que falava bem, aquele que tinha boa voz para cantar, ou boas pernas para dançar. Mas a sociedade actual não sente mais a necessidade de perfeição expressiva; está aberta a todas as formas. Cada um tem verdadeiramente uma alma, cada um tem qualquer coisa a dizer. A noção de estilo existe ainda por hábito, mas a verdade da arte, hoje, está na sensibilidade, já não está na técnica. A arte não é possível de outro modo senão pela emoção. O que procuramos, é menos um cálculo exacto do mundo do que uma evocação afectiva que o permite entender num plano exterior à realidade.
É isto, um erro? Terá sido este deslizamento do domínio do real para o domínio do emotivo que desviou a arte do seu percurso na direcção da consciência? Ou é o começo de um novo caminho na direcção de uma consciência verdadeiramente humana, por assim dizer presa na sua própria aventura falível e sem verdade intemporal?
Talvez o movimento na direcção da beleza não seja mais que uma espécie de tentativa para alcançar a revelação. Beleza dos objectos que é preciso aprender a ver como são, desprovidos dos seus mistérios e dos seus rituais, reino de tudo o que é igual, não igualmente indiferente, mas igualmente poderoso, igualmente atroz, igualmente sumptuoso, reino de tudo o que acontece.
Tradução de Helena Serrão
J.M.G. Le Clézio, L'extase matérielle, Gallimard, Siant-Amand, 2008, pags 206,207