Henry Cartier-Bresson, 1957
Na medida em que a criança não conhece ainda o mundo,
devemos introduzi-la nele gradualmente; na medida em que a criança é nova,
devemos zelar para que esse ser novo amadureça, inserindo-se no mundo tal como ele
é. No entanto, face aos jovens, os educadores fazem sempre figura de representantes
de um mundo do qual, embora não tenha sido construído por eles, devem assumir a
responsabilidade, mesmo quando, secreta ou abertamente, o desejam diferente do
que é. Esta responsabilidade não é arbitrariamente imposta aos educadores. Está
implícita no facto de os jovens serem introduzidos pelos adultos num mundo em perpétua
mudança. Quem se recusa a assumir a responsabilidade do mundo não deveria ter filhos
nem lhe deveria ser permitido participar na sua educação.
No caso da educação, a responsabilidade pelo mundo toma a
forma da autoridade. A autoridade do educador e as competências do professor
não são a mesma coisa. Ainda que não haja autoridade sem uma certa competência,
esta, por mais elevada que seja, não poderá jamais, por si só, engendrar a autoridade.
A competência do professor consiste em conhecer o mundo e em ser capaz de
transmitir esse conhecimento aos outros. Mas a sua autoridade funda-se no seu
papel de responsável pelo mundo. Face à criança, é um pouco como se ele fosse
um representante dos habitantes adultos do mundo que lhe apontaria as coisas
dizendo: «Eis aqui o nosso mundo!»
Todos sabemos como as coisas hoje estão no que diz respeito
à autoridade. Seja qual for a atitude de cada um de nós relativamente a este problema,
é óbvio que a autoridade já não desempenha nenhum papel na vida pública e privada
(…)— a violência e o terror exercidos pelos países totalitários nada têm a ver
com a autoridade — ou, no melhor dos casos, desempenha um papel altamente
contestado. No essencial, significa isto que se não pede já a ninguém, ou se não
confia já a alguém, a responsabilidade do que quer que seja. É que, em todo o lado
onde a verdadeira autoridade existia, ela estava unida à responsabilidade pelo
curso das coisas no mundo. Nesse sentido, se se retira a autoridade da vida política
e pública, isso pode querer significar que, daí em diante, passa a ser exigida
a cada um uma igual responsabilidade pelo curso do mundo. Mas, isso pode também
querer dizer que, consciente ou inconscientemente, as exigências do mundo e a
sua necessidade de ordem estão a ser repudiadas; que a responsabilidade pelo
mundo está, toda ela, a ser rejeitada, isto é, tanto a responsabilidade de dar
ordens como a de lhes obedecer. Não há dúvida de que, na moderna perda de autoridade,
estas intenções desempenham ambas o seu papel e têm muitas vezes trabalhado
juntas, de forma simultânea e inextricável. Ora, na educação esta ambiguidade relativamente
à atual perda de autoridade não pode existir. As crianças não podem recusar a autoridade
dos educadores, como se estivessem oprimidas por uma maioria adulta— ainda que,
efetivamente, a prática educacional moderna tenha tentado, de forma absurda,
lidar com as crianças como se se tratasse de uma minoria oprimida que necessita
de ser libertada. Dizer que os adultos abandonaram a autoridade só pode
portanto significar uma coisa: que os adultos se recusam a assumir a
responsabilidade pelo mundo em que colocaram as crianças.
Hannah Arendt “A crise na Educação, Relógio D`Água,Lx, 2000 p.43
e 44, Arendt 1968
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