segunda-feira, junho 01, 2020

O direito natural corresponde ao que a vontade geral deseja


Eugène Delacroix, A liberdade guiando o povo (1830)

Se, pois, meditardes atentamente em tudo o que antes foi dito, ficareis convencidos de que: 1º o homem que escuta tão-só a vontade particular é inimigo do género humano; 2º a vontade geral é, em cada indivíduo, um acto puro do entendimento que, no silêncio das paixões, raciocina sobre o que o homem pode exigir do seu semelhante, e sobre o que o seu semelhante tem o direito de dele exigir; 3º esta consideração da vontade geral da espécie e do desejo comum é a regra da conduta relativa à reciprocidade entre particulares na mesma sociedade, de um particular para com a sociedade de que é membro, e da sociedade, de que é membro, para com todas as outras sociedades; 4º a submissão à vontade geral é o laço que une todas as sociedades, sem dele exceptuar as que são formadas pelo crime. Ah! A virtude é tão bela que até os ladrões respeitam a sua imagem no fundo das suas cavernas. 5º as leis devem ser feitas para todos e não apenas para um; caso contrário, este ser solitário seria semelhante ao argumentador violento, que remetemos ao silêncio no parágrafo 5;  6º uma vez que, das duas vontades, uma geral e outra particular, a vontade geral nunca erra, não é difícil ver a qual delas, para a felicidade do género humano, deverá pertencer o poder legislativo, e que veneração se há-de prestar aos mortais respeitáveis cuja vontade particular coincide com a autoridade e a infalibilidade da vontade geral; 7º mesmo que imaginássemos a noção das espécies num fluxo perpétuo, a natureza do direito natural não mudaria, porque diria sempre respeito à vontade geral e ao  desejo comum de toda a espécie; 8º a equidade está para a justiça como a causa para o efeito, ou seja, a justiça só pode ser a equidade explícita; 9º por fim, todas estas consequências são evidentes para quem raciocina, e quem não o quiser fazer, renunciando à qualidade de homem, deve ser tratado como um ser desnaturado.

Diderot, Direito natural, Artigo da Enciclopédia (1751-1765)

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