quarta-feira, março 26, 2025

Fundamentação da metafísica dos costumes

 


Elliot Hooker

“ Um homem, vê-se forçado pela necessidade a pedir dinheiro emprestado. Sabe muito bem que não poderá devolvê-lo, mas percebe melhor ainda que ninguém lho emprestará se não se comprometer a saldar a dívida ao fim de um determinado período. Sente-se tentado a fazer essa promessa; mas tem também consciência suficiente para perguntar a si próprio: “ Não será proibido, não será contrário ao dever sair de apuros por este meio? “. Suponhamos que, apesar de tudo, ele opte por esta via; a máxima da sua ação teria este significado: “ Quando estiver com dificuldades de dinheiro peço-o emprestado e prometo devolvê-lo, embora saiba que nunca o farei.” Ora é muito possível que este princípio do amor a si próprio, ou da utilidade pessoal, se concilie com tudo o que venha a ser o meu bem estar futuro; mas de momento a questão está em tentar saber se é um princípio justo. Converto pois a exigência do amor a si mesmo, numa lei universal e ponho-me a questão seguinte: “ Que sucederia se a minha máxima se tornasse uma lei Universal?”.Rapidamente constato que ela nunca poderia ter o valor de uma lei universal da natureza e permanecer em concordância consigo mesma, mas que pelo contrario deveria necessariamente contradizer-se. Pois admitir como uma lei universal que qualquer pessoa que pense esar em dificuldades possa prometer seja lá o que for que lhe ocorra, com a firme intenção de não cumprir essa promessa, seria de facto tornar impossível o prometer, qualquer que fosse a finalidade que nos propuséssemos, visto que ninguém acreditaria no prometido, e que toda a gente riria de tais demonstrações como se de vãos enganos se tratasse.

Emmanuel Kant, Fundamentação da metafísica dos costumes, Lisboa Editora, p.93

1 comentário:

Marcelo Melo disse...

Obrigado pela publicação.

Penso ser pertinente cruzar este exercício centrado na escala pessoal com a escala em que os políticos operam, nomeadamente no prometer coisas e saberem não poder cumprir por não depender só deles e/ou por não depender só do tempo deles.

O atual descrédito de algumas profissões ou setores de atividade entronca muito bem com o fundamento que esta publicação dá a conhecer.