quinta-feira, dezembro 30, 2010

O académico.(sem desprimor dos valorosos académicos; apenas uma chalaça para animar o fim de ano!)

O primeiro académico que encontrei pareceu-me muito magro. Tinha a cara e as mãos cobertas de porcaria, a barba e os cabelos compridos, e o fato e a camisola da mesma cor da pele. Havia oito anos que estudava um projecto curioso, e que, segundo disse, consistia em juntar os raios de sol para os engarrafar nuns frascos rolhados hermeticamente, de forma que pudessem servir para aquecer o ar quando os estios fossem poucos quentes. Disse-me que, no prazo de oito anos, estaria habilitado a fornecer, aos jardins dos homens de finança, raios de sol por preços razoáveis. Queixou-se do pouco dinheiro que possuía e pediu-me que lhe desse alguma coisinha para ajudar.

Jonathan Swift As viagens de Gulliver, p.176, Portugália, Lx, s.d

BOM ANO DE 2011 PARA TODOS OS QUE POR AQUI PASSAM!!

segunda-feira, dezembro 06, 2010

Serão os juízos morais universais?


Ara Guler, Istambul, 1966
... o certo e o errado serão o mesmo para todas as pessoas?
A moral é pensada muitas vezes como universal. se uma acção é errada, deve sê-lo para toda a gente; por exemplo, se é errado matar alguém para lhe roubar a carteira, então isso é errado, quer te preocupes com essa pessoa, ou não. Mas, se o facto de uma acção estar errada é uma razão para não ser realizada e as tuas razões para fazeres coisas dependem das tuas motivações, uma vez que as motivações das pessoas podem variar muito, então parece que não pode haver um conceito único de certo e errado, porque se as motivações básicas das pessoas diferem, não haverá um único padrão básico de comportamento que todas as pessoas tenham motivos para seguir.
Há três maneiras de lidar com este problema, nenhuma delas muito satisfatória.
Em primeiro lugar, podíamos dizer que as mesmas acções estão certas ou erradas para toda a gente, mas nem toda a gente tem razões para fazer aquilo que está certo e evitar o errado: só as pessoas com o género certo de motivações morais - particularmente a preocupação com os outros - fazem o que está certo em função de mais nadaa não ser a própria moral. Isto torna a moral universal, mas à custa de lhe extrair a sua força.
Em segundo lugar, podíamos dizer que toda a gente tem uma razão qualquer para fazer o que está certo e evitar o que está errado, mas que essa razão não depende das motivações que as pessoas têm de facto. É antes uma razão para alterarmos as nossas motivações, se não forem certas. esta resposta oferece uma conexão entre a moral e as razões para agir, mas não diz de forma clara que razões universais serão essas que não dependem das motivações que as pessoas têm de facto.(...)
Em terceiro lugar, podíamos dizer que a moral não é universal  e que só é moralmente exigida a uma pessoa aquela acção em relação à qual ela tem um certo tipo de razões para executar, dependendo estas razões do quanto ela , de facto, se preocupa com os outros em geral. Se tem fortes motivações morais, produzirão fortes motivações morais, (...) se as motivações morais forem fracas ou inexistentes, os requisitos morais serão fracos ou inexistentes.

Thomas Nagel,Que quer dizer tudo isto? Gradiva, Lx,1997, p.66,67