quinta-feira, junho 26, 2014

Cristina Beckert
16 de Fevereiro de 1956 -26 de Junho de 2014

Faleceu hoje a minha professora de Ética. Gentil, atenciosa e de uma honestidade intelectual irrepreensível, ensinou-me a pensar livremente e a saber escutar. Ainda guardo o trabalho sobre a Ética de Kierkegaard que fiz com o imenso entusiasmo com que me motivou a estudar Filosofia. Obrigada Cristina Beckert.

quarta-feira, junho 11, 2014

Exame de Filosofia

 
Informações para o Exame de Filosofia deste ano. AQUI

terça-feira, junho 10, 2014

To Be Or Not To Be - A mecânica e a uniformidade: o cómico do nazismo


Soluciona-se assim o pequeno enigma proposto por Pascal a certa altura dos Pensamentos: "Dois rostos semelhantes, cada um dos quais por si não faz rir, juntos fazem rir pela sua semelhança." Diríamos nós : "Os gestos de um orador, cada um dos quais não é risível em particular, pela repetição, fazem rir." É que a vida  activa não deveria repetir-se. Onde haja repetição ou semelhança completa, pressentimos o mecânico funcionando por trás do vivo.
Que o leitor analise a impressão obtida diante de dois rostos muito parecidos: verá que pensa em dois exemplares obtidos de um mesmo molde, ou em duas impressões de um mesmo carimbo, ou em duas reproduções de um mesmo cliché, em suma, num processo de fabricação industrial. No caso, a verdadeira causa do riso é esse desvio da vida em  direcção à mecânica.
E o riso será ainda mais intenso caso não se apresentem em cena apenas dois personagens, como no exemplo de Pascal, mas vários, o maior número  possível, todos semelhantes entre si, que vão e vêem, dançam, se agitam juntos, assumindo ao mesmo tempo as mesmas atitudes, gesticulando do mesmo modo. Ocorre-nos então distintamente a ideia de marionetas. Cordéis invisíveis parecem ligar braços a braços, pernas a pernas, cada músculo de uma fisionomia ao músculo análogo da outra: a inflexibilidade da correspondência faz com que a fragilidade das formas se solidifique diante de nós e que tudo se enrijeça como mecanismo. Tal é o artifício desse divertimento um tanto tosco. Os seus executantes talvez não tenham lido Pascal, mas certamente levam aos extremos uma ideia sugerida no texto de Pascal. E se a causa do riso é a vista de um efeito mecânico no segundo caso, ela devia estar já mais subtilmente no primeiro. Prosseguindo agora nessa via, percebemos confusamente consequências cada vez mais remotas, cada vez mais importantes também, da lei que acabamos de enunciar. Pressentimos visões ainda mais fugazes de efeitos mecânicos, sugeridas pelas acções complexas do homem e não simplesmente pelos seus gestos. Adivinhamos que os artifícios usuais da comédia, a repetição periódica de uma expressão ou de uma cena, a intervenção simétrica dos papéis, o
desenrolar geométrico das situações, e ainda muitos outros truques, poderão extrair a sua força cómica da mesma fonte. Nesse caso, a arte do teatro burlesco consistiria talvez em apresentar-nos uma articulação visivelmente mecânica de acontecimentos humanos, ao mesmo tempo conservando deles o aspecto exterior da semelhança, isto é, a maleabilidade aparente da vida. 
Tradução brasileira: Nathanael C. Caixeiro

Revista

Henri Bergson, O Riso, Zahar Editores, Rio de Janeiro, 1983, pp20, 21

segunda-feira, junho 09, 2014

Arte: Forma estética


Baskiat

A arte é, não só um meio para bons estados de espírito, mas, talvez, o meio mais poderoso e directo que possuímos. Nada é mais directo porque nada afecta a mente de um modo tão imediato; nada é mais poderoso, porque não há um estado de consciência mais excelente ou mais intenso do que o estado de contemplação estética. Assim sendo, procurar outra justificação moral para a arte, procurar na arte um meio para algo aquém dos bons estados de espírito, é um acto de teimosia que só um tolo ou um génio cometerão.

Muitos tolos cometeram-no e um homem de génio tornou famosa tal proeza. Nunca o carro se pôs tão obstinadamente à frente dos bois como quando Tolstói anunciou que a justificação da arte era a sua capacidade de promover boas acções. Como se as acções  fossem fins em si mesmas! Não há virtude nem vício em correr, mas correr com boas notícias é louvável, e correr levando a bolsa de uma velhinha não é. É sempre o fim em vista que confere valor à acção e, em última instância, o fim de todas as boas acções deve ser criar, encorajar ou tornar possível  bons estados de espírito. Assim, incitar as pessoas às boas acções por via de imagens edificantes é um negócio respeitável e um meio indirecto para o bem. Criar obras de arte é o meio mais directo para o bem que um homem pode praticar. É precisamente neste facto que reside a imensa importância da arte: não há um meio mais directo para o bem.

Por paradoxal que pareça, as únicas propriedades relevantes numa obra de arte, julgada como tal, são as propriedades artísticas (a forma significante): julgada como um meio para o bem nem vale a pena considerar outras qualidades, pois, dado não haver melhor meio para o bem do que a arte, não há qualidades de maior valor moral do que as qualidades artísticas.


Clive Bell, Arte, Edições Texto e Grafia, pp.78,79 (adap)