Ara Guler, 1987, Idade
A Filosofia, como entenderei a palavra, é algo intermédio entre a
teologia e a ciência. Como a teologia consiste em especulações sobre matérias
inacessíveis até agora ao conhecimento definido, mas como a ciência apela para
a razão de preferência à autoridade, quer da tradição, quer da revelação. Todo
o conhecimento definido (…) pertence à ciência; todo o dogma como o que excede
o conhecimento definido pertence à teologia. Mas entre teologia e ciência há
uma terra sem dono exposta aos ataques de ambos os lados: é a filosofia. As
questões de maior interesse para os espíritos especulativos raro têm resposta
científica e as respostas confiantes dos teólogos já não parecem tão confiantes
como nos séculos anteriores. Estará o mundo dividido entre espírito e matéria?
e, sendo assim, que é espírito e que é matéria? Está a alma sujeita à matéria
ou tem energias independentes? Tem o universo unidade ou fim? Evolui para algum
objetivo? Há realmente leis da natureza ou cremos nelas devido ao nosso inato
amor da ordem? É o homem o que aparece ao astrónomo, um pequeno conjunto de
carvão impuro e água, a arrastar-se impotente sobre um pequeno planeta sem
importância? Ou é o que pensava Hamlet? Será as duas coisas? Há um tipo nobre e
um tipo baixo de vida ou são todos meramente fúteis? Se um deles é nobre, em
que consiste e como realizá-lo? Deve o bem ser eterno para poder ser apreciado
ou merece procurar-se ainda quando o universo caminha inexoravelmente para a
morte? Existe de fato a sabedoria ou não passa de derradeiro requinte de
loucura? Não há resposta em laboratório para tais questões. Pretenderam as
teologias dar respostas, todas demasiado definidas, o que as torna suspeitas a
espíritos modernos. Estudar essas questões, senão responder-lhes, é a tarefa da
filosofia.
Bertrand Russell em
‘História da Filosofia Ocidental’
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