Foto: Peter Van Agtmael, 2014, Dois homens a aquecem-se ao fogo na destruída Shujai'ilya em Gaza.
Se quiséssemos acrescentar também algum testemunho para este
terceiro momento da essência da experiência, o mais indicado seria certamente
Esquilo. Ele encontrou a fórmula, ou melhor, reconheceu o seu significado
metafísico, fórmula que expressa a historicidade interna da experiência:
aprender pelo sofrer. Esta fórmula não significa somente que nos tornamos
inteligentes através do dano e que somente no engano e na deceção chegamos a
conhecer mais adequadamente as coisas. Assim compreendida a fórmula deveria ser
tão velha como a própria experiência humana. Porém Esquilo pensa mais que isso.
Refere-se à razão pela qual isto é assim. O que o homem deve aprender pelo
sofrer não é isto ou aquilo, mas a perceção dos limites de ser homem, a compreensão
de que as barreiras que nos separam do divino não podem ser superadas. No
último extremo, é um conhecimento religioso - aquele conhecimento a partir
donde se dá a origem da tragédia grega. Experiência é, pois, experiência da
finitude humana. É experimentado, no autêntico sentido da palavra, aquele que é
consciente desta limitação, aquele que sabe que não é senhor do tempo nem do
futuro. O homem experimentado, propriamente, conhece os limites de toda
previsão e a insegurança de todo plano. Nele consuma-se o valor de verdade da
experiência. Se em cada fase do processo da experiência adquire uma nova
abertura para novas experiências, isto valerá tanto mais para a ideia de uma
experiência consumada. Nela a experiência não chega ao seu fim, nem se alcança
uma forma suprema de saber (Hegel), mas é onde, na verdade, a experiência está
presente por inteiro e no sentido mais autêntico. Chega ao limite absoluto todo
dogmatismo nascido da volátil possessão pelo desejo do ânimo humano. A
experiência ensina a reconhecer o que é real. Conhecer o que é, vem a ser,
pois, o autêntico resultado de toda experiência e de todo querer saber em
geral. Mas o que não é, neste caso, isto ou aquilo, "mas o que já não pode
ser revogado" (Ranke). A verdadeira experiência é aquela na qual o homem
se torna consciente da sua finitude. Nela, o poder fazer e a autoconsciência de
uma razão planificadora encontra seu limite. Mostra-se como pura ficção a ideia
de que se pode fazer marcha atrás de tudo, de que há sempre tempo para tudo e
de que, de um modo ou de outro, tudo retorna. Quem está e atua na história faz
constantemente a experiência de que nada retorna. Reconhecer o que é não quer
dizer aqui conhecer o que há num momento, mas perceber os limites dentro dos
quais ainda há possibilidade de futuro para as expectativas e os planos: ou,
mais fundamentalmente, que toda expectativa e toda planificação dos seres
finitos é, por sua vez finita e limitada.
Hans-Georg Gadamer, Verdade e Método, , Rio de Janeiro,
Editora Vozes, 1986, pag.525 e 526
Tradução de Flávio Paulo Meurer, com adaptações,