quarta-feira, maio 30, 2018
domingo, maio 13, 2018
História da Ciência
David Seymour
Os exemplos mais óbvios de revoluções científicas são
aqueles episódios famosos do desenvolvimento científico que, no passado, foram
frequentemente rotulados de revoluções. Por isso, nos Caps. 8 e 9, onde pela
primeira vez a natureza das revoluções científicas é diretamente examinada, nos
ocuparemos repetidamente com os momentos decisivos essenciais do desenvolvimento
científico associado aos nomes de Copérnico, Newton, Lavoisier e Einstein. Mais
claramente que muitos outros, esses episódios exibem aquilo que constitui todas
as revoluções científicas, pelo menos no que concerne à história das ciências
físicas. Cada um deles forçou a comunidade a rejeitar a teoria científica
anteriormente aceite em favor de uma outra incompatível com aquela. Como consequência,
cada um desses episódios produziu uma alteração nos problemas à disposição do
escrutínio científico e nos padrões pelos quais a profissão determinava o que
deveria ser considerado como um problema ou como uma solução de problema
legítimo. Precisaremos descrever as maneiras pelas quais cada um desses
episódios transformou a imaginação científica, apresentando-os como uma
transformação do mundo no interior do qual era realizado o trabalho científico.
Tais mudanças, juntamente com as controvérsias que quase sempre as acompanham,
são características definidoras das revoluções científicas.(…)
Teoria e fato científicos não são categoricamente
separáveis, exceto talvez no interior de uma única tradição da prática
científica normal. É por isso que uma descoberta inesperada não possui uma
importância simplesmente fatual. O mundo do cientista é tanto qualitativamente
transformado como quantitativamente enriquecido pelas novidades fundamentais de
fatos ou teorias. Esta conceção ampliada da natureza das revoluções científicas
é delineada nas páginas seguintes. Não há dúvida de que esta ampliação força o
sentido costumeiro da conceção. Não obstante, continuarei a falar até mesmo de
descobertas como sendo revolucionárias. Para mim, o que faz a conceção ampliada
tão importante é precisamente a possibilidade de relacionar a estrutura de tais
descobertas com, por exemplo, aquela da revolução copernicana. A discussão
precedente indica como serão desenvolvidas as noções complementares de ciência
normal e revolução científica nos nove capítulos imediatamente seguintes. O
resto do ensaio tenta equacionar as três questões centrais que sobram. Ao
discutir a tradição do manual, o Cap. 10 examina por que as revoluções
científicas têm sido tão dificilmente reconhecidas como tais. O Cap. 11
descreve a competição revolucionária entre os defensores da velha tradição
científica normal e os partidários da nova. Desse modo o capítulo examina o
processo que, numa teoria da investigação científica, deveria substituir de
algum modo os procedimentos de falsificação ou confirmação que a nossa imagem
usual de ciência tornou familiares. A competição entre segmentos da comunidade
científica é o único processo histórico que realmente resulta na rejeição de uma
teoria ou na adoção de outra. Finalmente, o Cap. 12 perguntará como o desenvolvimento
através de revoluções pode ser compatível com o caráter aparentemente ímpar do
progresso científico. Todavia, este ensaio não fornecerá mais do que os
contornos principais de uma resposta a essa questão. Tal resposta depende das
características da comunidade científica, assunto que requer muita exploração e
estudo adicionais. Sem dúvida alguns leitores já se terão perguntado se um estudo
histórico poderá produzir o tipo de transformação concetual que é visado aqui.
Um arsenal inteiro de dicotomias está disponível, sugerindo que isso não pode
ser adequadamente realizado dessa maneira. Dizemos muito frequentemente que a
História é uma disciplina puramente descritiva. Contudo, as teses sugeridas acima
são frequentemente interpretativas e, algumas vezes, normativas. Além disso,
muitas das minhas generalizações dizem respeito à sociologia ou à psicologia
social dos cientistas. Ainda assim, pelo menos algumas das minhas conclusões
pertencem tradicionalmente à Lógica ou à Epistemologia. Pode até mesmo parecer
que, no parágrafo anterior, eu tenha violado a muito influente distinção
contemporânea entre o “contexto da descoberta” e o “contexto da justificação”.
Pode algo mais do que profunda confusão estar indicado nesta mescla de diversas
áreas e interesses? Tendo-me formado intelectualmente a partir dessas e de
outras distinções semelhantes, dificilmente poderia estar mais consciente de
sua importância e força. Por muitos anos tomei-as como sendo a própria natureza
do conhecimento. Ainda suponho que, adequadamente reelaboradas, tenham algo
importante a nos dizer. Todavia, muitas das minhas tentativas de aplica-las,
mesmo grosso modo, às situações reais nas quais o conhecimento é obtido, aceite
e assimilado, fê-las parecer extraordinariamente problemáticas. Em vez de serem
distinções lógicas ou metodológicas elementares, que seriam anteriores à
análise do conhecimento científico, elas parecem agora ser partes de um
conjunto tradicional de respostas substantivas às próprias questões a partir
das quais elas foram elaboradas. Essa circularidade não as invalida de forma
alguma. Mas torna-as parte de uma teoria e, ao fazer isso, sujeita-as ao mesmo
escrutínio que é regularmente aplicado a teorias em outros campos. Para que
elas tenham como conteúdo mais do que puras abstrações, esse conteúdo precisa
ser descoberto através da observação. Examinar-se-ia então a aplicação dessas
distinções aos dados que elas pretendem elucidar. Como poderia a História da
Ciência deixar de ser uma fonte de fenómenos, aos quais podemos exigir a
aplicação das teorias sobre o conhecimento?
Thomas Kuhn, A estrutura das revoluções científicas, p.26 a
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Filosofia da Ciência,
Thomas Kuhn
terça-feira, maio 01, 2018
A questão de saber que normas morais devem reger as sociedades multiculturais.
Paul D'Amato, EUA, 1989
Durante muito tempo os EUA foram conhecidos como um Melting Pot, querendo com isso dizer-se que havia lugar para
todos viessem donde viessem, que todos eram bem recebidos e que a pouco e
pouco as diferenças culturais se iriam esbatendo a favor da «nova realidade
cultural». Muitos americanos ainda acarinham essa ideia mas para muitos outros ela
é uma ilusão e até um insulto. (…) Hodiernamente, mesmo entrea queles que
pertencem à cultura dominante existe a consciência de que esta situação causa
danos ao conceito de cultura americana. A questão é o que fazer para a
resolver. Alguns defensores do multiculturalismo (teoria que advoga a
necessidade de assegurar representação no espaço público – universidades, meios
de comunicação, política – aos diversos grupos culturais) propõem que devemos
começar por nos ouvir uns aos outros. A esta versão do multiculturalismo
chamarei multiculturalismo inclusivo.
Mais tolerância e compreensão entre os vários grupos culturais é o que parece pretender-se, maior igualdade de oportunidades
e um trabalho conjunto que combata a ideia de que uma tradição cultural domina
o país e aqueles que não a partilham deve ser marginalizados. Este trabalho
deve começar nas escolas onde as crianças devem aprender o máximo possível
sobre as heranças culturais do maior número possível de grupos étnicos e
sociais. (…)Muitos dos proponentes do multiculturalismo adotam o relativismo
moral. Contudo, para surpresa de alguns, o relativismo não garante
necessariamente o multiculturalismo.
O relativismo ético afirma que não há um código moral
universal –que cada cultura escolhe o que é correto para si e nenhuma outra cultura
tem o direito de interferir. Esta ideia, ainda que com várias limitações, pode
funcionar quando as culturas estão separadas e isoladas porque nesse caso o
código moral é definido como o código da população dominante. Porém, numa
sociedade pluralista como a americana, é difícil funcionar porque a cultura
dominante (a sociedade branca) é cada vez mais acusada de insensibilidade à
diversidade cultural. Pode o relativismo moral funcionar num país em que nos
deparamos frequentemente com valores opostos (Roubar é errado e Roubar é
moralmente correto para os desfavorecidos) no mesmo bairro? Dado que o relativismo
exige que rejeitemos a ideia de um padrão cultural dominante, alguns poderão
optar por uma atitude de niilismo moral: nenhum valor é melhor do que outro dado que nenhum
valor é objetivamente correcto. Tal niilismo pode conduzir à desagregação do todo social e,
possivelmente, a uma maior coesão no interior de cada grupo cultural,
acentuando-se o conflito entre eles. Podemos descrever este conflito como balkanização: os grupos culturais têm pouco ou nada
em comum exceto o ódio pelo que outros grupos representam. Parece que o
relativismo moral não é a resposta aos novos problemas do multiculturalismo.
E se procurarmos a resposta no universalismo moderado? Se formos
universalistas moderados o que podemos esperar? O acordo com os outros grupos
acerca de certas questões, mas não em todas as questões. No caso do multiculturalismo podemos concordar com a promoção
da igualdade, da tolerância e da coesão da nação. Se não chegarmos a um cordo nisto, o
multiculturalismo (inclusivo) é uma causa perdida, assim como a ideia de
Estados Unidos. Segundo o universalismo moderado – proposto entre outros por
Rachels não podemos permitir uma diferença
acentuada nos valores e princípios que regem a convivência social. Não podemos admitir que matar membros de
uma família por uma questão de honra seja inaceitável num bairro e aceitável noutro.
O problema da possibilidade de um núcleo de valores comuns no interior de uma
sociedade multicultural é particularmente urgente e escaldante. Sem
valores comuns muito simplesmente não há sociedade.
Nina Rosenstand, The Moral of the
Story – An introduction to questions of ethics and human nature,(1993),
Mayfield,pp 80-81(Traduzido e adaptado por Joana Inês Pontes)
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Ética,
Multiculturalismo,
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relativismo moral
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