sexta-feira, outubro 07, 2022

Filosofia: uma indagação em tudo semelhante à ciência?

 

 


 

Edward Munch, 1904, Costa com casa vermelha

" Há um mito do génio solitário, que tudo pensa por si em glorioso isolamento. Não é assim que funcionam a filosofia ou a matemática ou a ciência natural. Embora muito nelas se tenha alcançado por via do pensamento solitário, isso foi feito por pensadores que tinham já aprendido muito com o trabalho dos outros. Talvez o mais próximo de um contra-exemplo a isto tenha sido o génio matemático indiano Srinivasa Ramanujan (1887 -1920), mas até ele começou com manuais. Os bons filósofos parecem-se menos ainda com gurus saídos do ermo. A filosofia avança por comparação racional de ideias rivais, através do diálogo, não do monólogo.  Há que estar envolvido na discussão para saber que ideias foram propostas como rivais às nossas, e que base comum temos com os proponentes daquelas para começar a argumentar contra as mesmas. O guru solitário carece de tal conhecimento.  Dois gurus têm de aprender tanto a ouvir como a falar um com o outro.(…)

A questão controversa é saber se os filósofos precisam ou não de muito mais conhecimento da história menos recente do seu assunto do que precisam os matemáticos e cientistas naturais nas suas áreas. Terá a filosofia contemporânea absorvido já todas as ideias significativas do trabalho anterior?

Eis uma ideia. É difícil saber que suposições a filosofia toma por garantidas até encontrarmos alguma filosofia do passado que não as tomava como garantidas. Aí reside parte do valor de as tomar por garantidas: de modo a não perder tempo a refletir sobre elas. Porém, os filósofos tipicamente querem detetar as suas suposições, e não as deixar passar despercebidas. “ A vida não examinada não é digna de ser vivida”, afirmou Sócrates, segundo Platão. Examinar a nossa própria vida envolve identificar aquilo que se tem tomado como garantido. Por exemplo, muitos filósofos contemporâneos pressupõem que os deveres morais se sobrepõem sempre a considerações estéticas de beleza e fealdade, sem estarem cientes de que fazem uma suposição substancial. Ler F.Nietzsche  poderia alertá-los para alternativas, e talvez fazê-los questionar a sua pressuposição”

Timothy Williamson, Filosofar, Da curiosidade comum ao raciocínio lógico, Lx, Gradiva,2019, p.p214,215

 

 

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