Larry Towell, Terra de ninguém, 2003. Um palestiniano foge por uma brecha na vedação de laje de 8 metros colocada para impedir o acesso à margem oeste da Palestina.
“O ceticismo de Hume parece derivar da conjunção das três
proposições seguintes:
(I)
não há verdades sintéticas “a priori” a respeito
do mundo externo;
(II)
qualquer conhecimento genuíno que tenhamos do
mundo externo deve ser derivado, em última instância da experiência percetiva;
(III)
só são válidas derivações dedutivas.
(IV)
Referir-me-ei a estas três proposições,
respetivamente como a tese antiapriorista, a tese experimentalista, e a tese
dedutivista. Elas implicam que para qualquer enunciado factual h constituir conhecimento,
tem de haver premissas verdadeiras e que relatam experiências percetivas e das quais h é logicamente derivável. Mas se h fala do mundo externo e e só fala de experiências percetivas, h vai mais além de e e, portanto, não pode
ser logicamente derivado de e.
Os filósofos usam frequentemente
o termo conhecimento como uma palavra-sucesso; mas, neste livro, o termo será
usado para denotar um certo corpo organizado de saber sem a implicação de estar
livre de erro. Assim pode dizer-se: “O conhecimento médico do século dezoito
era muito imperfeito e continha muito de erróneo”. Só estará a ser usado como
palavra-sucesso quando estiver em itálico. Assim, podemos enunciar o ceticismo
de Hume como a tese de que nada do nosso conhecimento do mundo externo é conhecimento.
Podemos escolher dentro da enorme
variedade de enunciados que figuram no nosso conhecimento factual, enunciados
ocorrendo aos níveis seguintes:
nível 0: relatos de perceções na primeira pessoa, do tipo aqui e agora (por
exemplo: ‘No meu campo visual há um crescente prateado contra um fundo azul
escuro’);
nível 1: enunciados singulares sobre coisas ou acontecimentos observáveis
(por exemplo: ‘Há lua nova esta noite’;
nível 2: generalizações empíricas sobre regularidades manifestadas por
coisas e acontecimentos observáveis (por exemplo: ‘ Uma lua nova é seguida por
marés vivas’);
nível 3: leis experimentais exatas sobre grandezas físicas mensuráveis
(por exemplo: - a lei de Snell da
refração ou a lei dos gases de Charles e Gay-Lussac);
nível
4: teorias científicas que são não só universais e exatas, mas ainda postulam
entidades inobserváveis (por exemplo - a teoria dos campos de força de Faraday-
Maxwell).
O ceticismo de Hume também pode
expressar-se como a tese segundo a qual nenhum enunciado de nível 1, ou
superior, possa ser justificado por enunciados de níveis mais baixos. É uma
teoria epistemológica de carácter muito negativo. (…)
Para o ceticismo pirrónico, o mapa do conhecimento empírico é muito simples: só mostra um oceano indiferenciado de incerteza. Para o ceticismo de Hume, o mapa mostra um oceano de incerteza com uma pequena ilha de certeza no meio; esta ilha contém, para qualquer pessoa X no instante t, o conhecimento egocêntrico de X em t sobre as suas próprias experiências percetivas, etc.”
J.W.N. Watkins, Ciência e ceticismo (1984), Lx, 1990, Fundação Calouste Gulbenkian, p.15,16,17
Sem comentários:
Enviar um comentário