Burt Glinn A discussão deste tema começou
aqui, há cerca de um ano atrás. O tema voltou à ordem do dia. Contrariamente à perspectiva colocada, apresentamos um outro texto que se apresenta defendendo o casamento homossexual. Basicamente os argumentos destes textos partem de duas crenças básicas: a primeira, apresentada por Scruton, é contra, defende o casamento como aliança fundamentada na necessidade de segurança e preservação da espécie mas também em algo a/histórico, como uma comunhão primordial. A segunda perspectiva considera o casamento como um direito civil dos indivíduos considerados isoladamente, o casamento deve ser acessível a todos porque todos e cada um por si, são iguais perante a lei. A soma de razões apresentadas e o brilhantismo dos argumentos não altera a nossa crença básica a favor ou contra, essa adesão parece fazer-se antes de qualquer razão e fundamenta-se numa adesão emocional para a qual encontraremos depois uma maravilhosa explicação. De modo que discutir este problema parece ser pura perda de tempo. Penso, no entanto que esta discussão decorre de outra mais fundante e séria: 1º Se a legislação deve privilegiar as liberdades indivíduais em relação ao equilíbrio social. 2º Se as leis humanas podem e devem regular todos os aspectos da vida social sem qualquer submissão a princípios religiosos.A construção de um Estado laico choca ainda muita gente porque parece que em alguns aspectos usurpa um espaço que não é o seu , que pertence a outra dimensão, uma dimensão onde os homens não podem dispôr segundo os seus interesses. Este é, parece -me, o problema que entrava a aceitação de novas leis sobretudo quando não se coadunam com a tradição cristã/católica.
" A decisão de casar faz parte dos direitos fundamentais dos indivíduos e, por essa razão, implica igualmente uma dimensão igualitária: nenhum grupo poderá ser excluído senão por uma razão demolidora. É como com o voto; não existe um direito constitucional de votar, mas é inconstitucional (Nos Estados Unidos) impedir um grupo qualquer de exercer esse direito; nessas condições, a questão coloca-se: quem tem direito ao casamento e que razões serão suficientemente poderosas para ignorar esse direito?
O futuro do casamento parece continuar a ser, num certo sentido, semelhante ao seu passado. As pessoas vão continuar a unir-se, a formar famílias, a ter filhos e, por vezes, a separarem-se. A constituição americana exige, no entanto, que seja o que for que o Estado venha a decidir o faça na base da igualdade. O governo não pode excluir um grupo de cidadãos das vantagens da sociedade civil ou da dignidade alicerçada do casamento sem uma razão de interesse público convincente. Incluir completamente os casais do mesmo sexo é, num certo sentido, uma enorme oportunidade, tal como o casamento interracial o foi, no seu tempo, e como foi a obtenção do direito de voto pelas mulheres e os Afro-Americanos. (...) Uma simples política de humanidade exige que paremos de considerar os casamentos entre pessoas do mesmo sexo como uma desonra ou uma profanação em relação ao casamento tradicional, mas, ao contrário, que compreendamos os objectivos daqueles que procuram o casamento e a semelhança entre aquilo que eles procuram e o que procuram os heterossexuais. Reflectindo nesta direccção, o problema parece análogo áquele que era colocado no seu tempo pela mestiçagem: uma exclusão intolerável numa sociedade que deseja que todos beneficiem de respeito igual e igual justiça. "
Martha Nussbaum, Disent, in Philosophie Magazine, Outubro, 2009
Traduzido do Francês por Helena Serrão