Lartigue, Mulher no lago
Não há indução probabilística. A experiência
humana, tanto na vida comum como em ciência, adquire-se fundamentalmente
através do mesmo procedimento: a invenção livre, injustificada e injustificável
de hipóteses, antecipações ou expectativas, e a sua subsequente testagem. Esses
testes não podem tornar a hipótese "provável". Podem apenas
corroborá-la - e isto porque o "grau de corroboração" não é mais que
uma designação ligada a uma informação ou a uma apreciação da severidade dos
testes passados pela hipótese.
mas quase todos os meses se publicam mais
teorias da indução. é que há uma considerável força intuitiva na asserção de
que a propriedade de uma lei aumenta com o número de casos observados que a
verificam. Tentei explicar essa força intuitiva assinalando que não se
distinguiu adequadamente grau de corroboração e probabilidade. Quer a minha
explicação seja satisfatória quer não, a actual superabundância de teorias da
indução insustentáveis deve ser altamente satisfatória até para um indutivista.
(...)
Para ser mais específico, desafio qualquer pessoa
que julgue que é possível aumentar a probabilidade uma teoria por meio de algum
protocolo indutivo a explicar quatro coisas.
1)
Por
que é que os cientistas invariavelmente preferem uma teoria altamente testável
cujo conteúdo vai muito além de todas as provas observadas, a uma hipótese ad
hoc, concebida para explicar precisamente essas provas, e pouca coisa para
além delas, ainda que esta última tenha de ser sempre mais provável do que a
primeira relativamente a provas dadas. Como se há-de combinar a exigência de
elevado conteúdo informativo de uma teoria – a exigência de conhecimento – com a
exigência de probabilidade elevada, que significa falta de conteúdo e de
conhecimento.
2)
Como
se há-de evitar obter probabilidades iguais a 1 para todas a leis ainda não
refutadas, considerando que todas ela são instanciadas quase em toda a parte,
pois tanto a lei “Todos os cisnes são brancos” , isto é “ Não há nenhum cisne não-branco” como a lei “Todos os cisnes são não-brancos”
, isto é “Não há nenhum cisne branco” são instanciadas em todas as regiões onde
não haja cisnes, isto é, segundo o nosso conhecimento actual , em quase todo o
universo.
3)
Como
evitar obter, num universo infinito (ou num universo praticamente infinito) a
probabilidade zero para todas as leis universais, considerando que uma lei
universal acerca de um universo infinito pode sempre ser expressa como um
produto infinito de proposições singulares. ( Por exemplo, “ Todos os cisnes são
brancos” pode-se exprimir através de “Tudo tem a propriedade P” (em que ter a
propriedade P é definido pela frase “ou ser branco ou não ser um cisne”
4)
Como
é que eles respondem às objecções que coloquei na L.Sc.D, apêndice IX sobretudo
na página 390?.
Eis o meu desafio.
Karl Popper, O realismo e o objectivo da ciência,
in Pós-escrito à lógica da descoberta científica – Vol.I, Dom Quixote, Lisboa,
1992, p.264,265,266